RETROSPETIVA LUIS GARCÍA BERLANGA

Luis García Berlanga (Valencia, 1921 – Madrid, 2010) é um dos nomes mais marcantes do cinema moderno espanhol, sendo igualmente um dos realizadores que mais intransigentemente retrataram a realidade asfixiante do regime franquista e respetivas metáteses na Espanha contemporânea. Iniciada em 1951, com a realização de Esa Pareja Feliz e prolongando-se até 2002, ano em que conclui o seu último filme, a curta-metragem El sueño de la maestra, a obra de Berlanga reflete impiedosamente a evolução da sociedade espanhola ao longo de toda a segunda metade do século XX. Do autoritarismo repressivo à democracia, da guerra civil ao pacto do esquecimento, do silenciamento tácito com que as elites políticas pretenderam evitar reabrir as feridas da guerra à determinação do país se reconciliar com a sua memória histórica, do provincianismo folclórico, arreigado em estereótipos culturais, ao pretenso cosmopolitismo citadino, cioso das suas rígidas convenções sociais e falsos padrões morais, poucos terão sido os tópicos da atualidade espanhola que escaparam ao impulso irrisório do realizador. Recorrendo, nos seus filmes, a diferentes estratégias de conciliação do trágico com o cómico, todos os setores da sociedade – políticos, padres, burgueses, burocratas, camponeses, homens e mulheres, ricos e pobres... – se encontram aí subtilmente representados com o mesmo fulgor satírico, caraterística também partilhada com Manoel de Oliveira. A irreverência com que Berlanga retratou, melhor do que nenhum outro realizador espanhol seu contemporâneo, as contradições da transição democrática deixou descendência em toda uma geração de novos cineastas – de José Luis García Sánchez a Pedro Almodóvar, de Álex de la Iglesia a José Luis Borau – que, de diferentes maneiras, trouxeram até aos nossos dias a sua sagacidade crítica.

Nesta que será a sua primeira grande retrospetiva no Porto poderemos descobrir alguns dos filmes mais importantes do realizador, bem como muitos dos temas que os pontuam e que fazem da sua obra um observatório privilegiado do nosso tempo.