A AUDIÇÃO VIBRATÓRIA

de Gil Delindro

Capela e Cozinha da Casa de Serralves
24 JAN - 10 JUN 2025
2401 A AUDIÇÃO VIBRATÓRIA

A vibração faz-nos e desfaz-nos, a vibração atravessa-nos, liga-nos. Um sentir com o foco na vibração poderá transformar o modo como vivemos e percebermos o mundo?

No final do século XIX e início do século XX, a investigação científica no campo da física operou mudanças de paradigma radicais no entendimento do espaço, tempo, matéria, energia, vida, morte, consciência e corpo. O fenómeno da vibração esteve no centro destas revoluções em várias frentes: como força invisível transversal a toda a realidade; como nexo da diluição da distinção entre corpo e onda, entre matéria e energia, entre matéria e imaterial; como essência dos pensamentos ou de comunicações pré-verbais; ou, para a religião e o ocultismo, como agregador da alma e do corpo espiritual. 

Além das disputas entre a termodinâmica clássica e quântica, ou entre as diferentes vias da psicologia experimental, o conceito de vibração atravessou, igualmente, importantes vanguardas artísticas nas diferentes áreas disciplinares. Encontramo-lo entre os simbolistas, dadaístas, futuristas, no fundamento da narrativa para Joseph Conrad ou nas ondas cerebrais que tocam uma peça do compositor Alvin Lucier. 

Ainda assim, poucos serão os que, consciente e consistentemente, tentam abordar a realidade na sua dimensão vibratória, ou perceber sistematicamente o próprio corpo enquanto antena-condutor-transmissor de vibrações — talvez pelas dificuldades impostas pelas nossas limitações percetivas. 


A presente exposição de Gil Delindro (1989, Porto) cruza o percurso do artista ao longo de vários anos seguindo uma linha de reflexão sobre o processo de audição vibratória — uma forma de percecionar os sons sem recorrer à sensação auditiva. Esta é uma forma de perceção especialmente desenvolvida por pessoas surdas, ainda que acessível a praticamente todos nós. As obras mais recentes da exposição têm como ponto de partida uma investigação com a Comunidade de Surdos. A utilização de frequências sonoras inaudíveis — os infrassons, é comum à grande maioria das  obras, presentes em gravações realizadas, por exemplo, num glaciar nos Alpes. 


O interesse de Delindro por eventos naturais extremos enquanto pontos de inflexão em ciclos de criação-destruição levou-o a explorar um mundo sonoro alheio aos nossos ouvidos e difícil de capturar. Nas suas esculturas, as gravações destas paisagens sonoras inaudíveis são transmitidas a outros materiais e objetos que, por um lado, as tornam visíveis e, por outro, produzem, eles próprios, sons audíveis. As esculturas sonoras de Delindro fogem aos códigos factuais interpretativos dos objetos através da ação performativa da pressão sonora que ele injeta nos materiais. Esta energia libertada na reprodução das gravações encontra a essência vibratória vital dos corpos irradiando através deles, movendo-os, esculpindo-os, e invocando simultaneamente um processo de devir partilhado por todos.    

Em A Audição Vibratória, Delindro celebra a hipersensibilidade com que as pessoas surdas sentem o mundo sonoro, mas também aponta para um mundo que facilmente ignoramos: um mundo onde as fronteiras entre os corpos se dissolvem; onde conceções binárias tais como animado/inanimado, vida/morte, natureza/tecnologia são desafiadas; um mundo onde encontramos o outro pela ressonância; um mundo aberto a uma poesia vibratória.

 

Pedro Rocha

Curador da exposição

 

Gil Delindro é um artista sonoro e visual com amplo reconhecimento internacional.

A sua prática interdisciplinar recorre ao filme documental, instalação e performance, com base na investigação de campo em áreas como a bioacústica, ecologia e geologia.

A exposição A Audição Vibratória conta com o apoio da Câmara Municipal do Porto através do Programa Criatório.

Mecenas do Parque

2401 A AUDIÇÃO VIBRATÓRIA

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GIL DELINDRO

Gil Delindro (1989, Porto) É um artista Sonoro e Visual com amplo reconhecimento internacional.  Estudou arquitetura na FAUP e é licenciado em Arte Media pela FBAUP, tendo terminado o curso na Hochschule für Bildende Künste, Alemanha.    O seu processo de trabalho tem por base a pesquisa intensiva de campo: destacam-se: o deserto do Sahara (The Weight of Mountains, 2015), Floresta tropical Brazil (Resiliência, 2017), norte rural do Vietnam (Blind Signal, 2019), glaciar do Rhone (La Becque 2019), Vulcões de Auvergne (Intramuros 2020), Northumberland National Park (VARC 2022).   Recebeu prémios e mecenato de instituições como:  EPO ( European Patent Office), EMAP (European Media Art Platform), EDIGMA (prémio media art, PT),  Berlin Masters Award (DE), ENCAC (Rede Europeia de Criação Audiovisual), Fundação Calouste Gulbenkian (PT), Berlin Senate for Kultur &  Europa (DE), Goethe Institute (DE), OSTRALE (DE), STEIM foundation (NL), Ford Foundation (Resiliência, Brasil), Fundação Françoise Siegfried Meier (La Becque, Suíça), EOFA (Embassy of Foreign Artists, Suíça), VARC (Visual Arts in Rural Communities, UK), Teatro Municipal do Porto, (Reclamar Tempo, PT), SHUTTLE (PT), entre outros. Foi artista convidado para o BioArt & Design award de 2017, no MU Art Center, Holanda, sendo finalista na edição de 2018 do prémio.  A sua obra encontra-se representada em coleções privadas e públicas, e já apresentou trabalho na América do Norte e Sul, Ásia e Europa. Destacam-se as exposições: Resilience - Burned Cork (Museu de Serralves, Porto); Constructing Memory (Cluster, Winnipeg); A Grain Within this Cloud of Dust (Gallery Turm, Berlim); Permafrost (Laboral, Gijon); Un measurements (Ars Eletrónica, Linz); Perennial Earth (Goethe Institute, Vietnam); Harbour (Living Art Lab, Amsterdão); e To Bough and to Bend (Bridge Projects, Los Angeles).  Em 2016 foi selecionado pela plataforma SHAPE, como um dos artistas sonoros mais inovadores da Europa, sendo programado por festivais de referência como MusikProtokoll (AU), Novas Frequências (BR), CynetArt (DE) Athens Digital Arts Fest (GR), ARS Eletronica(AU), Submerge festival (UK), Semibreve (PT), Lisboa Soa (PT).   É co-fundador da Rural Vivo, uma associação interdisciplinar dedicada a atividades ecológicas, educativas e culturais na Reserva Natural do Gerês classificada pela UNESCO, cujo principal objetivo é combater a perda de oportunidades culturais nas aldeias rurais do Norte de Portugal e a inovação na preservação ecológica da região.   Tem trabalho publicado em disco pela Tzadik (Nova Iorque), Sonoscopia (Porto) e Ausland (Berlim), entre outros.

www.delindro.com


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